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terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

Aos amigos


"Amo devagar os amigos que são tristes com cinco dedos de cada lado.
Os amigos que enlouquecem e estão sentados, fechando os olhos,
com os livros atrás a arder para toda a eternidade.
Não os chamo, e eles voltam-se profundamente dentro do fogo.
- Temos um talento doloroso e obscuro.
construímos um lugar de silêncio.
De paixão".

Herberto Hélder


Encontrei essa poesia no blog "Amantes da Poesia". Interessante que, imediatamente, ela me disse muito, talvez, mais do que esperava naquele momento. A impressão que tive foi de ver todos os meus amigos representados nessas poucas e simples palavras. Aqueles de ontem e de hoje, o distante e o próximo, o presente e o ausente. Todos, ali, nas linhas e entrelinhas do texto poético.

A memória foi ativada quando da leitura do texto e lembrei dos amigos que não estão mais comigo, mas que foram fundamentais na construção da minha história pessoal. Talvez não fossem amigos para a vida toda, mas para aquele momento. Chegaram naquele instante necessário e se despediram quando viram que sua missão na minha vida se havia cumprido. Abriram fendas, fizeram-se ao largo e pousaram em outras vidas. Às vezes, pego-me imaginando como seria meu trajeto pessoal se não fosse a presença terna, serena, misericordiosa e solidária desses meus amigos. Certamente, uma alegria, sorriso e abraço a menos na minha caminhada. Contribuíram durante um tempo, alguns, durante um tempo ínfimo, mas deixaram pérolas que carrego vida afora.

Há aqueles que, diariamente, permanecem comigo . São poucos, mas são eles que dão um sentido luminoso aos meus dias. Há os tristes, embora a vida seja generosa e não tenha deixado faltar-lhes nenhum dos "dedos das mãos". Há aqueles que recebem a vida e seu mistério com reverência e estão sempre em harmonia com a realidade circundante. Suas palavras são seminais e seus gestos apontam para o alto. Há aqueles cuja existência está deitada na dolorosa experiência do desamor, do desafeto e do ostracismo. Receiam qualquer proximidade humana, com exceção daqueles que ganharam sua confiança e tiveram a porta do seu coração aberto. Esses estão sempre fazendo a radiografia daqueles que tentam ultrapassar sua fronteira. Temem o encontro humano, desconfiam demasiadamente, selecionam e compartimentarizam as pessoas em categorias, sem deixar-lhes uma brecha para que se mostrem e revelem seus mistérios. Em todos, encontro talentos que não foram guardados ociosamente. Não obstante os limites, cada um traz o dom de preencher meu dia e fazê-lo feliz. Carregam esse talento que construíram no silêncio ou no ruído da vida; o talento para se apaixonar mil vezes durante o dia por aquele por quem se sabem amados: o amigo.

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