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domingo, 23 de setembro de 2007

UMA MULHER E UMA UTOPIA


Acredito que contextualizar a crônica e indicar suas condições de produção se faz necessário para o entendimento do ponto de vista que assumo aqui. Desse modo, o texto foi escrito quando ainda era estudante universitário, ligado a movimentos estudantis e com a cabeça fervilhando de idéias e o coração desejoso de sanar as feridas do mundo. Está dito.



Aos 12 de fevereiro de 2005, Ir. Doroty, da Congregação de Notre Dame, despede-se do palco da vida e entra para a história como mártir da causa dos oprimidos. Ela foi friamente assassinada com três tiros a queima-roupa enquanto se dirigia a mais uma reunião onde discutiria o futuro da sua comunidade. Futuro que ela sonhou justo, igualitário e livre. Em vez reunião, um anúncio triste se faz ouvir entre aqueles que, ansiosos, aguardavam suas instruções encorajadoras e palavras de esperança numa manhã sem lágrimas e dor, fome e desespero, opressão e perda da liberdade.

Doroty, durante sua ação missionária em terras brasileiras, lançou a semente da fé no coração de homens e mulheres que se acreditavam vencidos pelo poderosos e descrentes dos seus próprios potenciais de transformação.

Dar vez e voz àqueles que, na história do Brasil, foram feitos pobres, excluídos e marginalizados, foi necessidade constante e, por que nao dizer, inquietante, daqueles que se fizeram arautos da libertação social e histórica, a saber: Chico Mendes, Darci Ribeiro, D. Hélder Câmara, entre outros. Doroty se inclui nesse rol que semeou sonhos no caminho de tantos que já nao sonhavam com dias melhores.

Che Guevara, certa vez, afirmou: "a maior ambição revolucionária é libertar o povo da sua alienação", e foi precisamente isso que Ir. Doroty perseguiu em vida e desejou para o povo brasileiro. Não obstante a injustiça e a desigualdade social grassar o cenário do nosso amado Brasil, temos necessidade premente de que vozes, como a de Doroty, continuem denunciando o autoritarismo do nosso governo, o servilismo do nosso povo alienado e a escravidão daqueles que, penosamente, sofrem quaquer tipo de preconceito, seja racial, religioso ou sexual.

Conformar-se resignadamente às estruturas políticas, econômicas e ideológicas vigentes em nosso país é permitir que essas estruturas se perpertuem socialmente e continuem a reproduzir seus mecanismos de exclusão e miséria. Não basta apenas discutir, escrever e formular soluções abstratas acerca das questões sociais, faz-se necessário uma ação concreta, uma práxis individual e coletiva que funde uma nova ética e, por conseguinte, um novo Brasil, mais inclusivo e igualitário. A revolução proposta por Che Guevara não diz respeito a um discurso abstrato, destituído de força transformadora, mas uma postura cotidiana de protesto às conjunturas autoritárias que oprimem e esmagam o homem sob seus pés iníquos.

Irmã Doroty, nao obstante a idade avançada, demonstrou coragem, lucidez e determinação quando decidiu resolver os problemas sociais do seu povo e, desse modo, devolvê-los a dignidade perdida. Os ícones da libertação sao muitos, e Doroty está entre eles. Mas não é suficiente a admiração anêmica que nao desperta para o engajamento por dias melhores e plenos. A irmã se revestiu da compaixão por todos aqueles que sofrem qualquer agressão aos seus direitos e, assim, se inscreve na história como testemunho vivo no coração dos que foram a razão última da sua ação social, os oprimidos. Além de admirá-la, precisamos nos comprometer como ela e assumir uma postura libertária a fim de que, livres de toda alienação, possamos ver o sol da justiça brilhar sobre nossas cabeças.