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terça-feira, 23 de novembro de 2010

Fliporto em leituras e sentidos


A Fliporto exigiu fôlego e disposição em seu primeiro dia. A tenda de conferências e mesas-redondas recebeu grandes nomes, como os biógrafos de Clarice Lispector: Benjamim Moser e Nádia Gotlib. Além deles, passaram pela tenda os escritores Nelson Vieira, Arnaldo Niskier, Luzilá Gonçalves, Camille Paglia, Márcia Tiburi, Gunter Axt, Ricardo Piglia, Raimundo Carrero, entre outros.
A mesa Clarice Lispector: como se constrói uma biografia foi mediada pela jornalista Mona Dorf e teve como debatedores os escritores Nádia Gotlib e Benjamin Moser. Mona Dorf foi repórter e âncora de telejornalismo. Atuou nos jornais da Globo, Cultura e Manchete e criou o programa Letras e Leitura que pode ser acessado na web e ouvido na rádio Eldorado. O escritor norte-americano Benjamin Moser nasceu em 1976 e fala seis línguas. Nascido em Houston, Texas, Moser matriculou-se num curso de chinês mas, ao perceber que não levava jeito para os ideogramas, decidiu estudar português. No terceiro semestre do curso, deparou-se com A Hora da Estrela de Clarice Lispetor. A leitura desse livro desencadeou um processo de encantamento pela obra de Clarice que não parou de crescer. A professora Nádia Gotlib é livre-docente da Universidade de São Paulo e pesquisadora da obra e vida de Clarice Lispector. Escreveu a biografia Clarice, uma vida que se conta e Clarice fotobiografia.
Os debatedores, mediados por Mona, responderam e explicitaram pontos de congruências e dissonâncias entre suas biografias. Nádia Gotlib foi cativante em suas colocações sobre Clarice e sua obra. A intimidade com que a biógrafa trata a autora dá a impressão de que a conhece por dentro e em todos os seus meandros e sutilezas. O mistério Clarice, embora seja difícil desevendá-lo e traduzi-lo em palavras,tem em Nádia um princípio de interpretação, pois ela ao menos permite acessá-lo de uma maneira singela e iluminadora. Traduzir em palavras a palavra dita por Clarice é uma tarefa que só quem a bebeu por inteiro e em gotas tão esmiuçadas pode fazê-lo. Nádia fez a experiência da palavra clariceana e, em suas biografias, encontramos as chaves que abrem as portas que permitem o acesso a esse mistério que nunca se dá por inteiro.
Leituras da obra e leituras da vida de Clarice: cada biógrafo as constroem de perspectivas diferentes. Ora dando ênfase a um determinado aspecto, ora a outro. Se Nádia Gotlib privilegia o aspecto literário, o uso da palavra, a linguagem em contínua fruição e objeto de reflexão dentro da obra clariceana, Benjamin relaciona a condição miserável da família Lispector, os problemas econômicos e sociais enfrentados por eles quando decidiram sair da Ucrânia e vir para o Brasil e a obra de Clarice Lispector.
Tenho saboreado cada página do livro de Benjamin Moser. Nelas, tenho mergulhado num oceano sem fundo, num mistério insondável e numa vida que não conheceu limites; nem mesmo aqueles impostos pela palavra. Clarice talvez tenha realizado aquela passagem descrita de maneira emocionada no poema de Tagore quando diz estar livre da escravidão das palavras. Se, por um lado, a palavra não a escraviza, por outro, espalha-se e produz efeitos irreversíveis naqueles que ouvem a sua voz. Essa experiência pode ser mais uma vez descrita nas palavras de Rabindranath Tagore:

Se não falas, vou encher o meu coração
Com o teu silêncio, e agüentá-lo.
Ficarei quieto, esperando, como a noite
Em sua vigília estrelada,
Com a cabeça pacientemente inclinada.

A manhã certamente virá,
A escuridão se dissipará, e a tua voz
Se derramará em torrentes douradas por todo o céu.

Então as tuas palavras voarão
Em canções de cada ninho dos meus pássaros,
E as tuas melodias brotarão
Em flores por todos os recantos da minha floresta.


Clarice se fez palavra para que pudéssemos ser turbilhão, desequilíbrio, conflito, e, enfim, encontrar a paz.
Abraços clariceanos.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Fliporto 2010: literatura, cinema, gastronomia e música


Participei no último fim de semana da Festa Literária Internacional de Porto de Galinhas - FLIPORTO. O evento acontecia no balneário de Porto de Galinhas, mas foi transferido para Olinda. A mudança não poderia ser mais oportuna, uma vez que Olinda abriga um cenário propício às manifestações culturais. O Centro Histórico de Olinda revela minúcias de um retrato multifacetado da cultura local. Artesãos, músicos, atores, pintores, enfim, artistas dos mais variados segmentos compõem esse cenário que encanta os passantes que transitam pelas ruas históricas da cidade.
A mesa de abertura da Fliporto teve como mediador o jornalista Geneton Moraes Neto e Eva Schloss e Moacyr Scliar como debatedores.
A escritora judia Eva Schloss, sobrevivente de um campo de concentração nazista, falou da experiência dilacerante vivenciada nas fugas, no trajeto em trens superlotados e em condições subumanas até o campo e os dias em Auschwitz. Schloss lançou durante a Fliporto seu mais recente livro A História de Eva e emocionou o público ao responder perguntas feitas pelo jornalista Geneton Moraes e Moacyr Scliar.
A obra e o testumunho de Eva Schloss ganham atualidade incontestável, uma vez que atos bárbaros motivados por intolerância a homossexuais, negros, nordestinos e outras minorias ainda fazem tantas vítimas e promovem pequenos holocaustos cotidianos.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Recomeçar é preciso...


Leitores e leituras suspensos, compartilhando intervalos e buscando novos espaços de significação. Leituras omitidas, deslocadas, silenciadas; espaços deixados em branco, sentidos retidos. Resultado de um processo de reclusão e atenção voltada para os livros e a leitura impressa. Motivo? Razão? Justificativa? Eis: uma seleção para o programa de doutorado da UFPE. Obtive êxito? Não, não obtive. Fui reprovado na (entre)vista. Quer saber se estou triste, acabrunhado? Não, não estou. E não me pergunte por quê. Aprendi a lidar com as adversidades ou me transformei num bloco de mármore? Nada disso. Apenas acreditei cegamente e sem vacilar nestas palavras:

É a verdade o que assombra
O descaso que condena,
A estupidez, o que destrói

Eu vejo tudo que se foi
E o que não existe mais
Tenho os sentidos já dormentes,
O corpo quer, a alma entende.

Esta é a terra-de-ninguém
Sei que devo resistir
Eu quero a espada em minhas mãos.

Eu sou metal, raio, relâmpago e trovão
Eu sou metal, eu sou o ouro em seu brasão
Eu sou metal, me sabe o sopro do dragão.

Não me entrego sem lutar
Tenho, ainda, coração
Não aprendi a me render
Que caia o inimigo então.


- Tudo passa, tudo passará...

E nossa história não estará pelo avesso
Assim, sem final feliz.
Teremos coisas bonitas pra contar.

E até lá, vamos viver
Temos muito ainda por fazer
Não olhe pra trás
Apenas começamos.
O mundo começa agora
Apenas começamos.

(Renato Russo - Legião Urbana)

Voltei com muitas leituras a produzir... e sentir.
Força sempre!