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terça-feira, 12 de abril de 2011

MANUEL BANDEIRA E A POESIA ERÓTICA


Dando continuidade a publicação de poemas eróticos, publico um de Manuel Bandeira que foi presente dado pelo poeta a Zuenir Ventura. Manuel Bandeira costumava reunir-se com um grupo de alunos em sua casa e, em uma dessas reuniões, entregou o poema abaixo a Zuenir Ventura, então seu aluno. Sexo e linguagem: uma combinação de rara beleza.


A cópula

Manuel Bandeira

Depois de lhe beijar meticulosamente
o cu, que é uma pimenta, a boceta, que é um doce,
o moço exibe à moça a bagagem que trouxe:
culhões e membro, um membro enorme e tungescente.

Ela toma-o na boca e morde-o. Incontinenti,
Não pode ele conter-se, e, de um jacto, esporrou-se.
Não desarmou porém. Antes, mais rijo, alteou-se
E fodeu-a. Ela geme, ela peida, ela sente

Que vai morrer: - "Eu morro! Ai, não queres que eu morra?!"
Grita para o rapaz que aceso como um diabo,
arde em cio e tesão na amorosa gangorra

E titilando-a nos mamilos e no rabo
(que depois irá ter sua ração de porra),
lhe enfia cona a dentro o mangalho até o cabo.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

...e o erotismo se fez poesia.



A um estranho

Estranho que vai passando! Você não sabe o quanto tenho te
olhado,

Você deve ser aquele que eu procurava, ou aquele que eu
procurava, (e veio a mim tal um sonho)

Em algum lugar certamente vivi uma vida feliz ao seu lado.

Recordo tudo quando quase nos encostamos, fluídos, afetivos,
castos, maduros,

Você cresceu ao meu lado, e foi um menino ou uma menina,

Comemos e dormimos juntos, seu corpo não era apenas seu
Nem meu corpo apenas meu,

Entrega-me o prazer de seus olhos, face, carne, quando passamos,
você leva minha barba, meu peito,
minhas mãos,

A você nada direi, eu fico a pensar em ti quando estou sentado
sozinho ou acordado noite adentro,

Estou a esperar, não duvido que te encontrarei novamente,

Estarei atento para não te perder
(Walt Whitman)



A CANTORA GRITANTE

Cantava tão bem
Subiam-lhe oitavas
Tantas tão claras
Na garganta alva
Que toda vizinhança
Passou a invejá-la.
(As mulheres, eu digo,
porque os maridos
às pampas excitados
de lhe ouvir os trinados,
a cada noite
em suas gordas consortes
enfiavam os bagos).
Curvadas, claudicantes
De xerecas inchadas
Maldizendo a sorte
Resolveram calar
A cantora gritante.
Certa noite... de muita escuridão
De lua negra e chuvas
Amarraram o jumento Fodão a um toco negro.
E pelos gorgomilos
Arrastaram também
A Garganta Alva
Pros baixios do bicho.
Petrificado
O jumento Fodão
Eternizou o nabo
Na garganta-tesão... aquela
Que cantava tão bem
Oitavas tão claras
Na garganta alva.

Moral da estória:
Se o teu canto é bonito,
Cuida que não seja um grito.
(Hilda Hilst - Bufólicas - 1992)

terça-feira, 5 de abril de 2011

Un chant d´amour: a única obra cinematográfica de Jean Genet



Un chant d´amour é a primeira e única obra cinematográfica do escritor francês Jean Genet. Lançado em 1950, o filme recebeu nos USA a rejeição concernente a trabalhos magistrais que se afastam do lugar comum e inovam na abordagem da realidade. Genet foi ousado nesse trabalho que coloca em destaque o desejo. Em vinte e seis minutos de filme, o desejo é o personagem principal que não se vê, mas sabe-se que está lá.
A película conta a história de dois prisioneiros homossexuais que têm o desejo vetado pelas paredes das celas. Habitando celas vizinhas, os prisioneiros - dos quais não sabemos o nome, pois o filme foi originalmente filmado sem audio - alimentam o desejo de estar juntos e compartilhar aquilo que foi interompido, negado e interditado pelas paredes que os separam. Resta compartilhar o cigarro por meio de um canudo que atravessa um pequeno buraco feito na parede. Essa parece ser a única ponte que ainda os mantêm ligados. Ao compartilhar a fumaça do cigarro, compartilha-se o hálito, o sopro, a vida e o desejo que habita suas cavernas mais recônditas.
Mas não para por aí... O desejo que consome os dois homens e a necessidade de proximidade humana conduz ao que há de mais pragmático: a realização sexual por meio da masturbação. Ao lado da realização física da necessidade sexual caminha uma realização que é de outra ordem e que, por enquanto, podemos chamar de espiritual. Essa dimensão espiritual vivenciada pelos prisioneiros que ardem em desejo e ânsia aparece no filme sob a forma de um colar de flores. Essas duas dimensões (física e metafísica) fundem-se sem dar margens à dicotomias, conflitos ou qualquer coisa do gênero.
Sabe-se que Jean Genet foi preso devido à prática de roubo e, desse modo, o filme tem um caráter autobiográfico. A parede que separa os amantes é representativo de todas as interdições vivenciadas pelo escritor à época em que escreveu e dirigiu o filme. Embora a realidade homossexual tenha mudado de 1950 para cá, ainda é possível vislumbrar paredes que separam, oprimem e aniquilam desejos não permitidos ou vistos com desconfiança.
A falta do audio e a consequente omissão dos nomes universalizam a experiência dos dois homens, de modo que qualquer pessoa pode assumir seu lugar nas cenas que desfilam exuberantes diante do cinéfilo.
A presença de uma terceira personagem aponta para outro aspecto da realidade que é a daquele que ver, deseja mas nega o desejo nascente. Esse aspecto é representado pelo carcereiro que, numa atitude voyeur, observa, mas não realiza o desejo. Esse desejo contido, recalcado, transformar-se-á em punição. Temos agora a figura do recalcado que disfarça o desejo e o usa contra si mesmo e os outros.
Dois homens. Um voyeur. Apenas vinte e seis minutos. E uma obra primorosa feita tão somente para fãs do cinema avant-garde.

Força sempre.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Bandeira presente


Um pouco mais de Manuel Bandeira.

Cotovia


— Alô, cotovia!
Aonde voaste,
Por onde andaste,
Que saudades me deixaste?


— Andei onde deu o vento.
Onde foi meu pensamento
Em sítios, que nunca viste,
De um país que não existe . . .
Voltei, te trouxe a alegria.


— Muito contas, cotovia!
E que outras terras distantes
Visitaste? Dize ao triste.


— Líbia ardente, Cítia fria,
Europa, França, Bahia . . .


— E esqueceste Pernambuco,
Distraída?


— Voei ao Recife, no Cais
Pousei na Rua da Aurora.


— Aurora da minha vida
Que os anos não trazem mais!


— Os anos não, nem os dias,
Que isso cabe às cotovias.
Meu bico é bem pequenino
Para o bem que é deste mundo:
Se enche com uma gota de água.
Mas sei torcer o destino,
Sei no espaço de um segundo
Limpar o pesar mais fundo.
Voei ao Recife, e dos longes
Das distâncias, aonde alcança
Só a asa da cotovia,
— Do mais remoto e perempto
Dos teus dias de criança
Te trouxe a extinta esperança,
Trouxe a perdida alegria.
(Manuel Bandeira)

Abraços poéticos,

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Manuel Bandeira: poemas revisitados


Por ocasião das comemorações em virtude do aniversário de Manuel Bandeira, publicarei poemas selecionados desse inesquecível homem das letras. Se estivesse vivo, Bandeira completaria 125 anos. Ignorando os limites temporais, o poeta preferiu eternizar-se. Ele conseguiu...

Minha grande ternura


Minha grande ternura
Pelos passarinhos mortos;
Pelas pequeninas aranhas.


Minha grande ternura
Pelas mulheres que foram meninas bonitas
E ficaram mulheres feias;
Pelas mulheres que foram desejáveis
E deixaram de o ser.
Pelas mulheres que me amaram
E que eu não pude amar.


Minha grande ternura
Pelos poemas que
Não consegui realizar.


Minha grande ternura
Pelas amadas que
Envelheceram sem maldade.


Minha grande ternura
Pelas gotas de orvalho que
São o único enfeite de um túmulo.
(Manuel Bandeira)

Força sempre!