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terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

RECORDAÇÕES DE UM MESTRE


Hoje, conversando com amigos, recordei as aulas do Profº Paulo Gervais. Discorri sobre o modo de falar, o pé encostado na parede, a voz aveludada e a serenidade que marcavam suas aulas. Era impressionante o efeito que suas palavras tinham sobre a platéia atenta que o escutava sem pestanejar. Sentimos sua saída da faculdade, mas ficaram seus ensinamentos, sua generosidade e atenção. Abaixo, uma de suas crônicas:



Acerca do nosso tempo e sua medida


Neste inverno, o dia inteiro passa com a mesma cor. Não adianta procurar no céu o risco de sangue das horas da barra da manhã quebrando, nem à tardinha o ouro velho das horas do sol das almas. Todas as horas têm a mesma cor cinzenta. Então para que saber as horas, se o céu não se altera? E no relógio apenas se pode contar números? Esta hora, por quem perguntas, sei dizer que passa, por que o perfume antes vivo na toalha agora quase não se sente, e um silêncio cresce, e cede a uma dor de coisa já vista e sofrida a novidade do primeiro encontro. Não conto os números no relógio para medir a extensão do nosso tempo; ele tem uma duração de alegrias e dores. Não nasce o sol nem se porá sobre nós. Estamos fora da órbita dos dias; e seu tempo não se mede em números, nem pelo tamanho das sombras, ora longas ora curtas - como lâminas negras projetando cortes sobre a carne dos mortais; nasce em nós o tempo e vive em nós; é a duração do que sentimos, e as estações, sua qualidade. E por conta disto, em nosso coração aninhou-se uma primavera grande que, muito orgulhosa, não quer saber do verão que queima a terra, e joga areia por onde vamos, nem do inverno, que chove até fazer no chão um verde de lôdo traiçoeiro, que faz deslizar e cair. E apesar de seguir lá fora o mundo vestido em paletó de cinzas, em nós a primavera se desnuda; em nós é que se levanta o sol e sopram ventos de festa.

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